Do Serviço Noticioso Um Mundo A Ganhar (SNUMAG) de 18 de Julho de 2011, aworldtowinns.co.uk

Os tanques alemães rolam no Médio Oriente, graças a Israel

Tanque alemão Leopard 2A6 com a nova arma Rheinmetall 120mm L55
Tanque alemão Leopard 2A6 com a nova arma Rheinmetall 120mm L55 (Foto: Krauss-Maffei Wegmann GmbH & Co. KG.)

A recente decisão de Berlim de vender 200 tanques Leopard-2 à Arábia Saudita faz luz tanto sobre a participação activa da Alemanha na repressão dos povos árabes como sobre a centralidade de Israel nessa repressão.

A venda desses tanques deveria ser secreta. Estranhamente, alguém do conselho alemão de segurança nacional passou a notícia à revista Der Spiegel, a qual, em vez de a ignorar, provocou um escândalo que levou alguns observadores a acreditar haver nos mais altos círculos divergências sobre esta questão.

Esses tanques de 62 toneladas estão equipados com sistemas de armamento avançados. O seu mecanismo de estabilização permite-lhes disparar os seus canhões com grande precisão enquanto avançam a alta velocidade em terrenos acidentados. Israel usou os seus próprios tanques Merkava, baseados em versões anteriores dos Leopard-2 e em componentes alemãs importadas, durante a sua última invasão do Líbano. Mas este modelo particular dos Leopard-2 também está equipado para ser usado contra civis desarmados. Tem à frente “lâminas de aprovação” do tipo arado, concebidas para afastar barricadas, e características “não letais” para “controlo de multidões”.

Um tanque Leopard 2A6M canadiano em solo afegão
Um tanque Leopard 2A6M canadiano em solo afegão

“Este é o tanque perfeito para levar até ao Barém e esmagar qualquer insurreição”, comentou a 7 de Julho ao The New York Times um investigador do Centro Internacional de Bona para a Mudança. Em Março passado, a Arábia Saudita enviou tanques, blindados e tropas para o Barém para pôr fim a um movimento de protesto que exigia que a monarquia concedesse à maioria xiita os mesmos direitos que à elite sunita. Cinco dezenas de médicos e enfermeiros hospitalares enfrentam agora a prisão por terem tratado manifestantes feridos. Muitos foram torturados para fazerem “confissões” televisionadas. Dois manifestantes foram condenados à morte. “Também é um bom tanque para combater qualquer manifestação em Riade”, a capital saudita, acrescentou.

A Arábia Saudita construiu mesmo uma via pavimentada para permitir que as suas forças armadas rolassem até ao minúsculo vizinho arquipélago do Barém, pela mesma razão por que sempre agiu de forma a dominar outros vizinhos, como o Iémen: a família real saudita teme que qualquer instabilidade e agitação popular ameacem o seu reinado. Os defensores de Obama quanto à monarquia saudita usam normalmente o seguinte argumento de real politick: o Irão xiita está a encorajar os xiitas do Barém a exigirem os seus direitos como forma de ameaçarem os governantes sauditas, os quais temem uma revolta da minoria xiita da Arábia Saudita contra o seu despotismo. O que este raciocínio deliberadamente negligencia é a questão do que justo e do que é injusto. O que está subjacente é que os xiitas não devem ter direitos iguais porque isso pode ser nefasto para os interesses norte-americanos.

Tanques Leopard 2A6M canadianos em acção no Afeganistão
Tanques Leopard 2A6M canadianos em acção no Afeganistão

Os responsáveis alemães adoptaram uma táctica diferente na defesa destas vendas de armamento, a ponto de não comentaram nada. Em geral, o governo tentou sufocar o escândalo com o que alguma comunicação social chamou de “silêncio de ferro” e recusou-se a confirmar ou a negar as notícias. Mas um porta-voz de política externa da União Democrata Cristã da Chanceler Angela Merkel alegou que o negócio era moralmente defensável porque visava proteger Israel.

“Cada passo que damos na região, damo-lo na condição de que promova a segurança e o direito de Israel a existir”, disse Philipp Missfelder (NYT).

Citando um responsável anónimo, o Suddeutsche Zeitung noticiou que Israel e os EUA tinham apoiado o negócio, dando como prova disso o facto de nenhum governo ter levantado nenhuma objecção pública, nem sequer depois de o escândalo ter rebentado.

Poderia perguntar-se como, e contra quem, é que estes tanques alemães irão defender Israel. No fim de contas, mesmo que se engula o ilusório argumento da ameaça existencial a Israel colocada pelo Irão, ninguém alega que ela possa tomar a forma de exércitos persas a marchar até Telavive através da península árabe.

Um tanque alemão Leopard 2A6-PSO, preparado para combater insurreições
Um tanque alemão Leopard 2A6-PSO, preparado para combater insurreições. A pá hidráulica de limpeza pode ser erguida e rodada para os lados, removendo barricadas e outros obstáculos.

Estes tanques só têm um objectivo plausível, e ele é o povo da própria península. Como até mesmo o NYT tentou explicar: “Antes visto por Israel como ameaça potencial, o governo da Arábia Saudita é cada vez mais visto como uma garantia de estabilidade numa região em revolta, numa altura em que um fervor revolucionário varre o Médio Oriente”.

“Promover a segurança e o direito de Israel a existir” significa fornecer algumas das ferramentas de matar pessoas das mais modernas do mundo a um dos regimes mais medievais do mundo (ainda pior que a República Islâmica do Irão, no que diz respeito aos direitos das mulheres) para preservar a “estabilidade” – defendendo, do seu próprio povo, a rede de regimes reaccionários e maioritariamente dependentes dos EUA que se estendem de Marrocos à Turquia, juntamente com defender Israel do povo que foi atacado e esmagado para que fosse o estado sionista fosse construído.

A dedicação da Alemanha a Israel não tem nada a ver com compensação pelos crimes cometidos contra os judeus, tal como esses crimes não justificam novos crimes contra outros povos. As vendas de armamento a Israel desempenharam um importante papel no rearmamento alemão, iniciado nos anos 50, quando empresas alemãs começaram a fabricar para Israel armas que as forças armadas alemãs ainda não estavam autorizadas a ter nos termos do tratado que pôs fim à 2ª Guerra Mundial. O desenvolvimento da tecnologia e do fabrico de armamento com Israel e para Israel (frequentemente em conjunto com os EUA, Grã-Bretanha, Espanha e outras potências) ajudou a Alemanha a tornar-se o terceiro maior exportador de armas do mundo, uma indústria que foi central para a riqueza dos seus capitalistas financeiros, ao mesmo tempo que criou um exército extraordinariamente bem equipado, mesmo que em simultâneo supostamente estivesse a renunciar ao seu passado do tempo da guerra.

Revolta no Barém
Revolta no Barém (Foto: Getty Images)

A venda de tanques Leopard-2 à Arábia Saudita trará cerca de 1,7 mil milhões de euros às principais empresas alemãs. Embora a imprensa norte-americana tenha criticado a Alemanha por estar a ser “mercantilista, com uma política externa que se preocupa, em primeiro lugar, com os seus próprios interesses económicos” (NYT), isto soa a falso tendo em conta o facto de que “Os sauditas também estão em conversações com empresas norte-americanas para a compra de equipamento de defesa no valor de 41 mil milhões de euros, no que se tornará o maior contrato norte-americano de sempre” (Agence France Press). Mas esta reciclagem de petrodólares para os cofres ocidentais surge em conjunto com interesses económicos muito mais vastos e com a política que os representa.

Embora os Social-Democratas rivais de Merkel tenham aproveitado esta ocasião para a acusar de “assustadora falta de discernimento” (Die Welt Online), eles fizeram a mesma política quando estiveram no governo. Em 2005, no seu último dia no governo, a coligação “vermelho-verde” de Social-Democratas e Verdes assinou um contrato de venda de mais submarinos Dolphin a Israel, que poderá usá-los para distribuir os seus mísseis nucleares por todo o Mar Vermelho e Oceano Índico, apontados sobretudo ao Irão e ao Paquistão, colocando assim centenas de milhões de pessoas sob a ameaça acrescida de um holocausto nuclear.

A aliança estratégica da Alemanha com Israel tem sido um factor substancial que permitiu à sua classe dominante capitalista monopolista florescer de novo depois da sua derrota na 2ª Guerra Mundial. De facto, o domínio do Médio Oriente de que Israel é o actual pivô tem sido um importante factor na prosperidade de todas as potências imperialistas ocidentais.

(Para saber mais sobre a história da cooperação alemã-israelita no armamento, ver “Na água, em terra e no ar”, de Otfried Nassauer, Outubro de 2006, em alemão em bits.de/public/articles/friedensforum/ff0406.htm e em inglês em bits.de/public/articles/friedensforum/ff0406eng.htm.)

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